sábado, 5 de maio de 2012

Transparente

                                                            Primeiro dia 



  
Estava me arrumando graciosamente como em qualquer outro dia, mas hoje não era um dia qualquer, era o primeiro dia de aula em uma cidade nova. Tinha de começar com o pé direito.
A produção começou com meus tênis excessivamente chamativos em rosa e meia-calça. Foi difícil me adaptar a saia com brilhinhos, mas a vesti de qualquer forma.
Minha camiseta preta quase não estava em destaque por causa do casaco de ombro cor de rosa.
Levemente passei gloss para avermelhar ainda mais meus lábios. E pendi em meus cachos loiros uma porção de laçinhos. Não podia esquecer de caprichar no lápis de olho.
-Para que tenta produção? – perguntou-me meu pai da porta do meu quarto – Devo lembrá-la que só possui quinze anos, moçinha?
-Pai – reclamei – Se quiser ser popular é assim que devo estar.
-Tudo bem Miss popular, vamos? Não quero me atrasar – ele pediu.
Assim que passei pela cozinha despedi-me da minha mãe e comi um bolinho.
Meu pai me daria uma carona ate o colégio, mas não precisava ser vista com ele ou já começaria com má reputação. Ao longo da estrada ele não comentou nada, papai sabia que eu não gostava de conversar.
Assim que nos aproximávamos os cinco metros do colégio saltei do carro.
-Cuide-se – ele pediu.
-Pai, por favor.
Ele sorriu e seguiu em direção ao seu trabalho. Meu pai não pensou duas vezes em aceitar a proposta de trabalho em Nova York e sair do Tennessee para mim foi como me atualizar. Por mais que só iríamos ficar talvez um curto período de tempo de dez meses eu não poderia perder esse tempo sem aproveitar o que à cidade tinha a me oferecer.
Assim que encontrei o prédio e comecei a vagar pelos corredores percebi a diferença entre as duas cidades. As pessoas aqui não só tinham mais estilo como também eram... Interessantes.
-Olá! – fui barrada na entrada por uma garota que parecia a rainha do rosa. Se os cabelos fossem loiros ela pareceria a Barbie em si.
-Oi! – sorri com animação.
-Sou Catlin – ela sorriu o que era um bom sinal. Estendi a mão, mas ela não apertou – Não se meta em meu caminho novata, ou se arrependerá disso. Como se pudesse – ela soltou um risinho e suas escudeiras acompanharam o ritmo.
Logo depois ela saiu derrubando os livros que estavam na minha mão. Antes que pudesse me abaixar para pegar os livros um Deus grego já os havia recolhido.
-Aqui – ele falou, mas ainda observava seu cabelo lindo e negro que lhe batia nos ombros. A frente do rosto havia uma franja irregular, mas extremamente sexy. Seus olhos eram azuis e seus cílios grandes o realçavam. Não vou comentar sobre o pecado que sua boca era.
-O... Obrigada! – recolhi os livros da sua mão e ele saiu.
Fiquei ali o observando sair. Ele era tão lindo e ainda podia apostar que era o garoto mais bonito do colégio. Mas precisava acordar, ele nunca me notaria, nem se eu quisesse.
-Se eu fosse você não ficaria de olho nele – uma garota chamou minha atenção. Fora as botas de soldado e o cabelo arco-íris, ela era extremamente normal e não me parecia nenhuma ameaça.
-Ah! Eu não...
-Você sim, mas não faça isso, você pode se arrepender...
-Espera, fazer o que?
-Ficar interessadinha por ele – ela avisou. Não entendi o porquê, ela estava interessada nele? – Seu horário – ela me estendeu uma folha de papel – Que chato! Você tem os mesmos horários que os meus.
-Ótimo! Assim você pode me dizer como tudo funciona por aqui – tentei soar bastante animada com isso.
-Vamos logo!
Ela seguiu a frente e eu fui a uma distancia considerável observando o local ao meu redor. Pude notar que duas salas depois da minha era onde o lindo garoto estava. Que pena!
Assim que igualei meus passos ao da garota e conseguimos chegar à sala notei que aquela era a sala mais desprovida da ala, quem sabe do colégio inteiro.
Havia umas quatro ou cinco garotas vestidas de preto por completamente. Vários garotos com o ego maior que o cérebro e a turma dos nerds. Fora isso não havia mais nada.
A garota dos mesmos horários que os meus não pertencia – ainda bem – a nenhum desses grupos. Mas sabia que ela também não era nem um pouco descolada. Sentei-me ao seu lado.
-Ainda não sei o seu nome – falei.
-Bel – ela se apresentou – Mas vamos ao que interessa. Quase ninguém aqui irá falar com você a não ser eu e... Eu.
-Ah! – lembrei-me do gato do corredor, talvez ela soubesse algo sobre ele – Por que não posso me aproximar dele?
-De novo essa historia? Muitas pessoas já fizeram essa pergunta – ela respirou fundo antes de continuar – A questão não é poder, é querer – ela deu de ombros.
-Isso não explica muito...
-Por que ele é louco, tudo bem?
-Louco do tipo...?
-Louco, pirado, lunático. Deixa de amolação agora – ela quase como implorou.
Ouvi muito bem o que ela havia acabado de falar, mas não conseguia ver ou entender como um gato daqueles poderia ser louco. Talvez ele apenas tivesse negado sair com muitas delas e por isso à fama.
-Então a que grupo pertence? – apontei para todo o redor da sala.
-Eu pertenço ao grupo exclusivamente da Bel, você pode entrar nele se quiser... Você seria a primeira.
-Que... Animador.
Deixei a conversa de lado assim que o professor adentrou a sala. Ele aparentava ser simpático, mas foi somente impressão uma vez que ele apenas sentou-se e ditou:
-Quero uma redação sobre tema livre em francês em minha mesa daqui a cinco minutos – ele nem mesmo parou para respirar – Duplas, para facilitar.
Fazer dupla com Bel, a garota esquisita que acabara de conhecer, era horrível uma vez que ela não sabia absolutamente nada de francês. Também não sabia que possuíamos neste colégio a matéria “linguagens com um professor tirano”.
-Algum tema? – perguntei.
-Podíamos fazer sobre macacos e como eles se habituam muito bem com os seres humanos.
-Não, obrigada!
Depois de ter feito quase toda a redação sozinha e ter entregado ao professor como ele pedira pudemos descansar enquanto ele as analisava com cautela.
Não pensei em continuar qualquer tipo de conversa com Bel, alem do que ela não me parecia do tipo de que aturava mais de duas perguntas por dia.
Pensei em que tipo de pessoa queria realmente ser aqui. E decidi que seria eu mesma com um pouco de exagero e acenderia certa chama.
Depois de ter analisado cada redação feita sem demora o professor Claude passou por cada assento torturando os alunos com palavras pelos seus erros de ortografia.
Tentei desviar minha atenção da sala, mas não ia a um lugar mais agradável.
Assim que chegou a nossa vez minhas pernas estavam tremulas pelo que ele pudesse falar. Quanto a Bel, estava estourando bolas de chiclete tranquilamente e lixando suas unhas.
-Péssima caligrafia – ele observou – E tenho certeza que podiam abordar um tema melhor que desejos de gestantes.
Não havia muito que fazer quanto à criatividade de minha recém colega. Alem do que o francês estava por minha parte ela tinha de fazer ao menos uma coisa.
O próximo horário que seu seguiu foi mais tranquilo. Ate por que a professora era muito mais paciente e menos grosseira também.
-Álgebra não é tão difícil quanto parece – a professora disse enquanto passava a cada um de nós uma lista de atividade.
Já havia dado todos aqueles assuntos, mas ela só deveria estar repassando para que não os esquecêssemos. Talvez ela os fosse usar novamente este ano e precisava que os exercitássemos.

Depois de finalmente passarem-se as aulas desnecessárias, nós fomos para o refeitório. Observei todo o lugar para gravar muito bem todos os detalhes e procurar por uma pessoa que não consegui encontrar.
Sentei-me ao lado de Bel em uma mesa não muito povoada. Na verdade apenas, Bel e eu estávamos sentadas nela. Mais uns minutos e um garoto juntou-se a nós na mesa. Ele possuía um jeito estranho de se vestir, mas não estava ali para questioná-lo uma vez que eu estivesse mais estranha do que ele.
-Olá, sou Till – o garoto apresentou-se – Melhor amigo de Bel.
-Prazer – mas estava concentrada em procurar o garoto do corredor.
-Lado direito, mesa escura no canto isolado – Bel disse.
-O que? – quis saber.
-O que garoto que você esta interessada, não se finja de desentendida – ela reclamou e iniciou uma conversa intima com o garoto.
Procurei por ele de acordo com as coordenadas que ela me dera. Ele estava lá, lendo um livro e comendo seu almoço. Não vi nenhum obstáculo daqui ate lá, então me levantei e ia seguir ate lá quando vi Catlin sentando-se ao seu lado.
-Achei que ninguém falava com ele – comentei com Bel.
-Por favor... – ela parou ao notar que não sabia como me chamava.
-Mia – apresentei-me de verdade.
-Esqueça dele tudo bem? Será melhor não se colocar no caminho da bobona da Catlin.
-Tudo bem! Esquecido – não queria procurar confusão com aquela garota, principalmente por que não queria ser considerada a novata que não sabe seu lugar.
Mas não resisti ao impulso de observar para ao menos saber o que estavam conversando. Ela sentou-se e mostrou interesse no livro que ele lia, ele o recolheu de suas mãos com rapidez e depois acho que pediu que ela se retirasse, pois ela se levantou e sentou-se com os populares.
Havia muitas pessoas ali que olhavam para o garoto no canto isolado com desconfiança, mas depois voltavam a suas vidas.

No fim de todas as aulas notei que não começara com o pé direito e que seria assim o resto do ano, mas amanha era um novo dia e podia mudar essa situação. E poderia voltar a usar meus jeans, já que não conseguira nem conseguiria ser popular. Não se dependesse de Catlin.
Esperei no estacionamento meu pai vir me buscar, mas esqueci-me que pedi para que ele me esperasse a cinco metros dali.
Bel ofereceu-se uma carona em nosso carro.
-Moro no mesmo quarteirão que você – ela comentou.
-Que legal! Será uma boa companhia – comentei de volta.
Cheguei em casa e mamãe quis saber como tinha sido as aulas, mas antes de respondê-la o que se tornaria uma enorme conversa fui tomar um banho.
-Então algo que te interessou? – ela quis saber.
-Bom! As aulas são tediosas como qualquer outra, mas...
-Mas? – ela me encorajou a continuar.
Olhei para todos os lados em busca de meu pai, mas ele ainda estava tentando estacionar o carro na garagem. Ele era péssimo manobrista e por isso sabia que ele iria demorar.
-Tem um garoto que é muito lindo – falei de uma vez.
-Isso! Sabia que tinha a ver com um bonitinho – ela comemorou – E então ele falou com você?
-Não, quer dizer, é só o primeiro dia. Ninguém fala com os novatos.
-Claro que fala, mas não vamos apressar nada não é?
-Mãe, é só um garoto.
-Não, é o garoto. Pretendem sair?
-Mamãe, por favor – juro como ficava ainda sim ruborizada quando conversava com minha mãe sobre isso, ela conseguia de qualquer forma me envergonhar – Ele só é bonito, mãe nada mais. Eu não o conheço, não falei com ele, só o vi tudo bem?
-Estou tão orgulhosa de você – ela quase estava chorando.
Minha mãe sempre fora assim e às vezes tinhas duvidas sobre o psicológico dela. Quer dizer, ela era dez vezes mais exagerada que qualquer mãe. Se tocasse em assuntos como beijos ela já estaria achando que o assunto era relações sexuais. Quem sabe se eu fosse falar sobre esse assunto acho que ela entenderia que eu teria sete filhos, moraria debaixo de uma ponte, seria fumante e alcoólatra e quem sabe outras mais.
-Estarei no meu quarto – avisei.
Assim que adentrei o quarto tranquei-o por dentro. Não que precisasse esconder algo de meus pais, mas era meu tempo de privacidade. Precisava dele para ter um espaço próprio ou meus pais saberiam da minha vida em cada detalhe.
Abri meu e-mail e meu blog. Gostava de sentar de frente ao PC e observar se alguém queria me aceitar como seguidor ou ser meu seguidor. O blog servia de desabafo, postava textos íntimos que poucas pessoas que me seguiam tinham acesso.

vida é como uma caixa de surpresas, quando você acha que ela não pode te surpreender, então é que ela mostra do que é capaz. Foi o que aconteceu comigo, hoje conheci uma pessoa muito interessante. Não o conheci exatamente, mas sei que é o garoto mais lindo que já vi em toda a minha vida.
Sabe quando você vê alguém e pensa que essa é a pessoa a qual você vem procurando faz um tempo? Bom, o garoto que conheci hoje se encaixa nesses padrões. Ele é gato, não tem namorada e bem... É só isso que eu sei sobre ele. Não se pode saber tudo não é?
Espero ansiosamente pelo dia de amanha quando voltarei a vê-lo.

Depois desse breve comentário não me restava fazer mais nada a não ser dormir, mas não era exatamente o que eu queria.
Ainda estava um pouco atordoada pensando sobre o que Bel havia dito e tudo o que havia acontecido. Quer dizer não havia chances de um garoto como ele ser realmente louco, não é? Não, é besteira da cabeça dela.
E Catlin, aquela garota era o tipo de aviso de perigo que eu queria obedecer. Algo nela me sugeria que o fizesse ou eu poderia de verdade sofrer graves consequências. E não digo ser expulsa do colégio, mas algo mais maléfico como ela.
-Pensando no futuro? – meu pai perguntou.
-Não, estou aqui no presente mesmo – respondi.
-Sabe costumava ficar assim também. Pensativo – ele riu como se fosse alguma piada – Não precisa se preocupar com nada disso agora querida. Você ainda tem muita coisa pela frente, então viva apenas o hoje tudo bem?
-Tudo bem! – ele já ia saindo quando o chamei – Pai.
-O que?
-Mamãe esta fazendo aquilo de novo.
-Vou conversar com ela sobre isso. Boa noite ou tarde, não sei.

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